domingo, 21 de agosto de 2011

PAI, FILHO E ESPIRITO DE CONTO DE DIAS CAMPOS.

COMO A FERRUGEM E A TRAÇA.

Ontem fui ao clube. E lá tive o desprazer de reencontrar Arimaze. Concordo que o nome (mesopotâmico) causa justa estranheza. Mas, explico: se de um lado procurei acautelar-me de uma futura ação indenizatória, preservando-lhe a identidade, de outro, foi ele quem mais se aproximou dos meneios com que ainda sou obrigado a conviver, em razão das circunstâncias.
E não foi fácil achar um bom representante. De primeiro, pensei em Salieri. Mas Mozart advertiu-me ser óbvia a ilação, o que não respaldaria a criatividade deste texto. Ao depois, cogitei em Juliana, a ex-empregada de Luísa. Mas veio Eça e me confidenciou que o primo Basílio tudo fizera para esquecer aquele arroubo, e não convinha que fosse desenterrado. Fui, então, à Grécia Antiga, e achei em Ftono a luva que servia. Nix, a personificação da noite, instou-me a que não envolvesse o nome de seu filho, pois ainda se ressentia dos dissabores que suas provocações infligiram às deusas Atena e Hera. Por fim, pedi licença a Voltaire, e este me apresentou àquele babilônio e a Zadig, o objeto de sua inveja. Encontrava a expressão que me faltava.
Mas se fiquei indisposto, hoje me revigoro, e esta crônica é a sua consequência. Dessa forma, faço a seguinte pergunta, que endereço a Arimaze, onde quer que se encontre: Numa relação entre invejoso e invejado, quem é que sofre? E antes que os milionésimos de segundo tragam a ululante resposta, Fr. Luiz de Souza se interpõe e, como que repetindo Antístenes, o pupilo de Sócrates, pontifica: “Assim como o ferro se consome com a ferrugem, assim o invejoso se está consumindo com a inveja.”
E diante do insofismável, que dizer ao súdito do longínquo império? Que seu ilusório senso de superioridade nada mais é do que uma das muitas máscaras com que a inveja lhe encobre as fuças? Que “A inveja é uma confissão de inferioridade”, como afirmou Philarete Chasles? Que “Onde há inveja, não há amizade”, como cantou Camões?
Quem sabe não seria o caso de pensar em Goethe, e, como Werther, seguir lendo o meu Homero. Afinal, se o próprio autor de Ilíada e de Odisseia atestou que “O invejoso emagrece com a gordura alheia”, nada mais prático do que me sentar, folhear, e dar tempo ao inexorável definhamento.
Talvez fosse melhor enfatizar – quiçá, ensinar – que a saúde dos portadores da “traça do talento”, como diria Campoamor, debilita-se com o tempo, a exemplo do aclarado no brilhante ensaio As mil e uma faces da Inveja, da lavra do Dr. Roque Theophilo, em que o ilustre professor demonstra serem eles geralmente ansiosos, tristes, revoltados, e muito mais vulneráveis às moléstias infecciosas, tais como a gripe, a herpes, e às doenças psicossomáticas, que podem acarretar câncer.
Há quem sugerisse lembrar da empatia, e, com isso, procurar sentir-lhe compaixão. Belo pensamento. No entanto, sou forçado a questionar-me: Tenho abnegação bastante? Confesso que não.
Cuidado, Arimaze, pois no conto em que você existiu, o iluminista francês escreveu que “O invejoso morreu de raiva e de vexame”...! Não é uma ameaça. É uma advertência.
De outra parte, alguém poderia cogitar da soberba, a prima irmã do “Gigante Rubro”, de Mira y Lopes. Concluiria, assim, que o autor é uma alma insatisfeita, e que supõe invejosos ao seu redor. Ora, por uma questão de equidade, e porque não temo a réplica, de antemão disponibilizo esse mote a Arimaze, rogando-lhe, contudo, que medite sobre o que aqui foi pincelado.
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