OS AUTOMÓVEIS E AS PESSOAS
George Câmara, petroleiro, advogado e vereador em Natal pelo PCdoB (07/01/10) www.georgecamara. com.br
É final de 2009, início de 2010. Época de férias escolares, recesso para muitas atividades profissionais e período preferencial também para férias do trabalho nas empresas. Nas ruas da cidade, um verdadeiro alívio no trânsito. Na manhã de seis de janeiro, feriado de Reis, estou em Natal e sigo no rumo do litoral sul, por volta da dez horas.
Escolhi esse horário por entender que estaria livre de qualquer dificuldade no trânsito, pois muita gente já havia se deslocado nesse percurso desde o dia anterior, em busca do descanso merecido. Ledo engano. Congestionamento inexplicável, numa fila interminável de carros de passeio.
Logo nas primeiras praias, Pium e Cotovelo, enorme quantidade de carros parados no acostamento ou na faixa do lado direito. Mas o “engarrafamento” não diminuía. À medida que prosseguia a viagem, maior quantidade de automóveis nas laterais, na frente e atrás de nosso carro.
Impressionado, indaguei à minha companheira como seria caso alguém viesse a necessitar de um atendimento médico de emergência naquelas circunstâncias. Comentávamos o quanto as cidades estão cada vez mais frágeis, nos dias atuais. Afinal, isso é a modernidade? O que são os carros senão um meio para uma melhor qualidade de vida do ser humano? Qual é mesmo a natureza desse problema: é apenas uma questão local? Está nos marcos de cada indivíduo ou se tornou uma questão de natureza pública?
Natal é uma cidade com 806 mil habitantes, pelos números do IBGE atualizados em julho de 2009. Conta com o registro de aproximadamente 250 mil veículos transitando em seu território de 170 km², somando-se mais 2 mil automóveis a cada mês. Lidera uma região metropolitana formada por 10 municípios, com uma população de 1 milhão e 300 mil pessoas, aproximadamente. Circulando na Região Metropolitana de Natal, cerca de 320 mil veículos registrados pelo DETRAN – RN.
Tais números se expressam em iguais proporções pelo Brasil afora, agravando-se o problema conforme o tamanho de nossas metrópoles. A cidade de São Paulo registra atualmente algo em torno de 600 veículos diariamente, o que nos dá o número assustador de 18 mil carros por mês que se somam à frota existente. Somente na capital. Nas demais cidades brasileiras de médio e grande porte, tal modelo se repete. Tamanha irracionalidade é absolutamente inaceitável.
Será que o modelo implantado no Brasil para o transporte de massas, sobretudo nas cidades e metrópoles atuais, atende às necessidades das pessoas? O parque industrial do setor automobilístico brasileiro, um dos maiores do mundo, foi montado na década de 1950, quando pouco mais de 36% da população morava nas cidades. Desenvolveu- se priorizando o veículo de passeio, subordinando sua lógica ao mercado consumidor individual, em detrimento do atendimento às necessidades crescentes do transporte coletivo para contingentes cada vez maiores.
No momento em que se debate em todo o país o temário da IV Conferência Nacional das Cidades, é preciso colocar na ordem do dia a questão do Transporte, da Mobilidade Urbana e da Acessibilidade, dando centralidade às pessoas. O modelo que ainda perdura no Brasil, há mais de meio século, já não responde às exigências atuais.
Sem o reconhecimento e a efetivação do direito ao transporte público de qualidade para todos, não conquistaremos as cidades mais humanas, requisito civilizacional para uma vida digna.
fonte: e-mail
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