SENTADO
EM CINZAS
Uma dos aspectos mais marcantes e conhecidos na vida de Jó, do ponto de vista
popular, diz respeito à sua paciência. Tanto é assim que virou ditado corrente
a expressão que diz “fulano tem a paciência de Jó”. Outra faceta
também realçada é a que aponta para a sua pobreza. Daí que, popularmente, é
costume também se dizer “mais pobre do que Jó”. Logicamente, muitas
pessoas usam a citação por ouvir falar, sem atentar nem conhecer a história
real do personagem. Em primeiro lugar, Jó não era pobre. Ao contrário. Era
riquíssimo para os parâmetros da época. A comprovação está na Bíblia, no livro
que leva seu nome, conforme registrado no capítulo primeiro, versículo
terceiro: “Possuía sete mil ovelhas, três mil camelos, quinhentas juntas
de bois e quinhentas jumentas; era também mui numeroso o pessoal a seu serviço,
de maneira que este homem era o maior de todos os do Oriente”. Como se
vê...
Acontece que um dia Jó ficou pobre. Não somente pobre como miserável.
Extremamente miserável. O capítulo 2, versículo 8, diz: “Jó, sentado em
cinza, tomou um caco para com ele raspar-se”. Era tudo que lhe restara:
cinzas e cacos. Os bens já perdera; a família também (a morte levara os dez
filhos), com exceção da esposa; a condição de líder; o status de pessoa
admirada e acreditada como bom empresário, além da saúde. Esta, de maneira
inexplicável, colocara-o em estado lastimável e estabelecera-lhe uma rotina
extremamente dolorosa. Um manto de tumores malignos tomara conta do seu corpo
“da planta do pé até o alto da cabeça”. A solução para descansar,
diante da impossibilidade de usar cama convencional, foi acomodar-se em cinzas.
Os amigos sumiram, o horizonte encurtou-se – a ponto de não vislumbrar
mais nenhuma solução para a vida – e a mulher passou a jogá-lo na direção
do suicídio.
Além dessas, outras conclusões podem ser tiradas da leitura de sua saga. O
“sentado em cinzas” revela, primeiramente, a vergonha social que
sobre ele se abateu, e, em segundo lugar, o raquitismo empresarial e material a
que chegou. As cinzas não representavam apenas um lenitivo para seu corpo coberto
de tumores, mas a realidade que se instalara em sua vida. Afinal, o que são
cinzas senão o resultado da queima de objetos sólidos, palpáveis, concretos,
transformados em pó pela combustão da vida? Em Jó tudo virou cinzas. Seu
patrimônio, dignidade, condição social, sonhos – e o pior: a saúde. A
solidão também lhe pesava bastante. E, como empresário, concluíra: sentado em
cinzas era o mesmo que sentado em nada. De tudo que perdera só não perdeu a fé.
Esta permaneceu firme. Segurar-se à fé foi a ponte que construiu, apesar de
tudo, para atravessar seus dias de homem doente, falido e abandonado.
Como Jó, atualmente, tem muita gente sentada em cinzas. Vida sem sentido,
oprimida, tornada pó. Rotina angustiante e vazia. A saída? Voltar-se para Deus.
É o que se conclui da história de Jó. Dos amigos só recebeu acusações; da
esposa exortação para amaldiçoar a Deus e, em seguida, abraçar a morte. A única
ponte a segurar Jó em vida foi a ponte da fé. Em Deus – seu Redentor. O
capítulo 19, versículo 25, registra o seu brado: “Porque eu sei que o meu
Redentor vive...”. Esta confissão levou-o a vencer o desejo de morte e o
manteve convicto de que outros dias lhe estavam reservados. Tempos depois,
família restaurada, saúde restabelecida, teve de volta, dobrado, o seu
patrimônio. “Porque veio a ter quatorze mil ovelhas, seis mil camelos,
mil juntas de bois e mil jumentas”, segundo o capítulo 42, versículo 12.
Eis o verdadeiro Jó e sua plenitude. Alçado a ela somente pela fé. Pela fé.
Somente.
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