UM
CORDEL PARA VOCÊ
QUE
CHORA POR FUTEBOL - José Acaci
Fui menino como tantos
meninos
que à tarde, ao cair do
arrebol,
ia para um campinho de
pelada
e jogava até não ver
mais o sol.
Eu corria, driblava e
dava chutes,
e gozava o prazer do
futebol.
Relembrando meu tempo de
criança
posso hoje dizer que
tive a sorte
de jogar bola com os pés
descalços,
dar topada em buraco e
levar corte,
pra dizer hoje em dia
pros amigos
que aquilo era o
verdadeiro esporte.
Eu torcia por um time
famoso,
e era fã de um grande
jogador.
Quando ele fazia um gol
de placa
eu vibrava com raça e
com amor.
O meu deus era aquele
centro-avante.
Nada mais para mim tinha
valor.
Acontece que um dia o
artilheiro
desse time pelo qual eu
torcia,
resolveu ir jogar em outro
time,
justamente o time que eu
não queria.
Descobri que o dinheiro
é quem domina,
e achei que foi uma
covardia.
Esse atleta, quando era
entrevistado,
a camisa do time ele
beijava.
Eu pensei que ele amava
o time
com o mesmo carinho que
eu amava.
Quando foi pro outro
time eu logo vi
que não era do jeito que
eu pensava.
E passei a pensar sobre
essas coisas:
O salários dos grandes
jogadores;
os bilhões que são
gastos numa copa;
hospitais sem remédio e
sem doutores;
os aumento gerais na
violência;
e o salário dos nossos
professores.
E pensei: ̶ Como alguém pode ganhar
cem milhões só porque chuta uma bola? .
̶ E porque quando um time perde
um jogo,
cidadão chora que não se consola,
mas não chora quando tem uma greve
e seu filho não vai para a escola?
Perguntei-me: ̶ O que
é mais importante?
̶ O meu time ter mais uma conquista?
̶ Os nossos hospitais funcionando?
̶ O estádio mais novo de uma lista?
̶ Um drible de um grande jogador?
̶ Ou o feito de um grande cientista?
Outro dia, na fila de um
banco,
escutei um senhor que
conversava
sobre a copa do mundo no
Brasil,
e até muito feliz ele
falava,
e prestei atenção no que
ele disse
para outro rapaz que o escutava.
Ele disse: ̶ Nós
perdemos a copa,
mas ganhamos um estádio
grandioso.
Quase quinhentos milhões
de reais
foram gastos nesse bem
precioso,
pros atletas poderem
jogar bola
no seu campo bonito e
espaçoso.
O rapaz que estava
escutando
virou-se para ele e
disse assim:
̶ Para quê um estádio assim tão bom,
e uma educação assim tão
ruim?
Esse estádio pode valer
milhões,
mas não vale um centavo
para mim.
E depois o rapaz
continuou:
̶ O governo decide, vem e faz,
se quisesse faria mais
escolas,
mais estradas e muitos
hospitais,
mas um estádio, meu caro
amigo, diga:
̶ Qual é o benefício que lhe traz?
O senhor que escutava, nesse
instante
quis falar mas a língua
deu enguiço,
repensou sobre o que
tinha falado,
e na copa com todo seu
feitiço,
em seguida falou para o
rapaz:
̶ Eu não tinha pensado sobre isso!
E o rapaz disse a ele: ̶ Tenha
calma,
que o senhor é mais um
pobre coitado
que acredita que a copa
do mundo
deixou para o Brasil
grande legado,
pois deixou-se
envolver-se pela mídia
que deixou todo mundo
enfeitiçado.
Quando é tempo da tal
copa do mundo
a TV cria
sensacionalismo,
fala dos jogadores como
heróis,
usa o hino em campanhas
de civismo,
pra lavar o seu cérebro
num oceano
de mentira e falso
patriotismo.
Eu ali, escutando essa
conversa,
refleti sobre um texto
que dizia
que quem ganha só um
salário mínimo,
conhecido também por “micharia”,
vai ralar por cinquenta
e oito meses
pra ter o que Neimar
ganha num dia.
(42.000 ÷ 720)
E na minha cabeça de menino
se passaram milhões de
pensamentos.
Desde então eu passei a refletir
sobre os fatos e
acontecimentos.
Repensei sobre mídia e
futebol,
e criei os meus próprios
argumentos.
Na TV eu vi um rapaz
chorando
pelo craque maior da
seleção,
pela falha de um
perna-de-pau,
pelo efeito de uma
contusão,
e então vendo o choro eu
refleti,
e tirei a seguinte
conclusão:
Se o povo continuar
chorando
por um time que um jogo
perdeu,
esquecendo dos problemas
reais,
sem lembrar dos
problemas que viveu,
vou pensar: ̶ Ou eu sou um sonhador,
ou então nosso povo
emburreceu.
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