DE
PABLO NERUDA
Confesso
ter vícios literários e a poesia de Pablo Neruda é um deles. Não menos
importante é minha paixão por Federico Garcia Lorca, seja na poesia ou na
dramaturgia. Apego-me aos seus trabalhos com interesses sempre renovados, para
aprender mais, descobrir detalhes, refletir na beleza simples da construção do
verso.
Qualquer
nota técnica sobre Neruda exige que se façam referências a Lorca,
principalmente por todos os sentimentos comuns que os atraiam. Ambos tinham
posições políticas avançadas e foram perseguidos pelos regimes ditatoriais dos
seus países. Lorca foi assassinado pelas forças franquistas em 1936, dois meses
depois de ter concluído sua obra-prima A Casa de Bernarda Alba. Neruda foi um
rio caudaloso de inspiração que não resistiu ao câncer, embora não faltem
suspeitas de que o golpe de 11 de setembro de 1973 apressou o desenlace,
ocorrido num hospital de Santiago vinte e dois dias depois da queda de Salvador
Allende. Dois anos antes recebera o Prêmio Nobel de literatura e deixou nada
menos de oito livros inéditos.
Tanto
em Lorca como em Neruda encontramos vertentes poéticas que os identificam com
os românticos ingleses do século XIX, entre eles Shelley e Keats, o verso
branco refulgindo de impressionantes imagens líricas, além da rebeldia presente
em suas vidas o que nos lembra de Byron.
O
poema de Neruda parece estar amalgamado na sua própria vida, revelada em dois
livros que não devem deixar de ser lidos e relidos; Para Nascer Nasci e
Confesso que Vivi. “Para nascer nasci, para conter o
passo de quanto se aproxima, de quanto me golpeia o peito como um novo coração
tremente”, escreve ele na abertura do para Nascer Nasci. Essa complexa
epígrafe é logo revelada no Mulher Remota:
“Esta
mulher cabe em minhas mãos. É branca e ruiva, e
minhas mãos
a levaria como uma cesta de magnólias.
Esta
mulher cabe em meus olhos. Envolvem-na os meus
olhares,
meus olhares que nada veem quando a envolvem.
Esta
mulher cabe em meus desejos. Desnuda está sob a
anelante
labareda de minha vida e o meu desejo queima-a como
uma
brasa.
Porém,
mulher remota, minhas mãos, meus olhos e meus
desejos
guardam inteira para ti a sua carícia porque só tu,
mulher
remota, só tu cabes em meu coração.”
Um
minuto de silêncio é muito pouco para homenagens e lembranças a quem tanto
ofertou. Guardemos Neruda, cuja imortalidade emerge no lirismo dos seus
próprios versos:
“En
su Llama mortal, la luz te envuelve.
Absorta,
pálida, dolente asi situada
contra
las viejas hélices del crepúsculo
que en
torno de ti da vueltas.”
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